É a economia, estúpido: o ano começou com Guedes dando as cartas no governo
Quem viu Bolsonaro na comemoração dos 400 dias de governo, certamente notou o presidente bem mais à vontade que outrora. A economia melhorou no 2º semestre, a popularidade subiu pela primeira vez e o ex-capitão não perde mais oportunidade de ostentar os juros baixos e a inflação reduzida como provas do sucesso do seu governo. Num país em que os analistas são mais sensíveis a índices macro-econômicos do que sobre o mercado de trabalho, Bolsonaro descobriu que o jogo é bem mais fácil se “economia” estiver a seu favor.
Quem soube capitalizar o novo momento do governo foi Paulo Guedes. Se o ministro já tinha força considerável, não tinha o suficiente para a relevância que tem assumido sobre a ala “ideológica” do governo.
Paulo Guedes foi cobrado em Davos pela questão ambiental e recebeu uma resposta imediata do governo: a criação do Conselho da Amazônia chefiado por Mourão, novo responsável por vigiar de perto as sandices do ministro do Meio Ambiente. O Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), até então nas mãos de Onyx na Casa Civil, foi transferida para o ministério da Economia. O próximo enquadrado pode muito bem ser o ministro da Educação, sobretudo porque Rodrigo Maia não esconde sua desaprovação a Weintraub e, por outro lado, Guedes sabe que depende do bom humor do presidente da Câmara.
Se Bolsonaro ainda protege Weintraub sabe-se lá porque, cedeu a uma vontade antiga de Guedes e elevou Rogério Marinho, secretário da Previdência e queridinho de Maia e do Centrão, ao posto de ministro. A mudança tende a gerar um efeito positivo na articulação do governo junto ao Congresso. Marinho substituiu Gustavo Canuto do Desenvolvimento Regional. A chefia do ministério responsável pelo Minha Casa, Minha Vida que foi um feudo político do Centrão nas gestões anteriores e agora retorna ao grupo.
Em resumo: se Guedes está alimentando uma minirreforma ministerial, é porque acatou o aviso do próprio Rodrigo Maia de que a condução das reformas não pode ser jogada “nas costas do Parlamento”. Para quem vibrou com a aprovação da Previdência e achou que o governo já disporia de maioria congressual para as demais reformas econômicas, o recado de Maia sinaliza que o Executivo precisará usar das suas prerrogativas (como o poder de nomear ministros, priorizar agenda e emendas, fazer propaganda) para impulsionar a agenda econômica.
O que ainda perturba o ambiente é a “pequena política” de Bolsonaro, objeto de consumo e satisfação dos bolsonaristas, realizada ao mesmo tempo que Guedes e o Congresso se ocupam do planejamento econômico. O último caso foi a diatribe populista contra os governadores a respeito dos impostos sobre os combustíveis.
Dessa vez, no entanto, a novidade foi que o “mercado” não deu importâncias às ameaças de Bolsonaro. O presidente afirmou que zeraria os tributos do combustível (o que significaria um rombo de R$ 27 bilhões) e o mercado nem se alterou, nem Guedes precisou aparecer na mídia para apagar o incêndio e defender seu projeto de equilíbrio fiscal.
O ministro da Economia já encontrou meios de blindar o mercado e falta-lhe fazer o mesmo junto ao Congresso. Para isso, precisa garantir uma rede de estímulos para que os parlamentares votem as reformas a despeito dos comentários ambíguos de Bolsonaro sobre corte de privilégios, redução de subsídios e os próprios políticos do Centrão. A emenda impositiva e o fundo bilionário já garantiram uma maior autonomia do Congresso, mas Paulo Guedes sabe que falta outros encaixes.
Para que Guedes continue a impôr seu projeto sobre o governo, a condição é óbvia: a ascensão econômica não pode parar. A meta cravada pelo ministro para 2020 é de 2% — dobro do crescimento em 2019 — o que é uma meta razoável, principalmente porque o ministro já provou ser criativo quando precisa crescer a qualquer custo (vide a liberação do FGTS).
A questão é que a temporada de revisão das expectativas já começou depois dos resultados abaixo do esperado no último trimestre (o consumo das famílias voltou a esfriar após o pump dos saques do FGTS) e os impactos negativos do Coronavirús. A UBS, por exemplo, já reduziu a expectativa de crescimento de 2,5% para 2,1%. Caso fure o piso de 2% estipulado pelo próprio Guedes, é provável que o cenário econômico e político vire e a desenvoltura do ministro seja desafiada.
Até lá, no entanto, será Guedes quem distribuirá boa parte das cartas do governo.