4 verdades sobre a queda de Marcos Cintra
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O secretário da Receita Federal, Marcos Cintra, foi exonerado do cargo a pedido de Jair Bolsonaro. Como explicou em seu twitter, o que motivou a queda foi a disputa pela recriação da CPMF (Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira), pela qual Marcos Cintra e Paulo Guedes vinham lutando a despeito da impopularidade do imposto.
Para além da querela propriamente tributária, o episódio escancarou outras questões decisivas.
1- Financeirização do setor produtivo
Ao tributar as movimentações financeiras (saques e depósitos), o governo proveria uma arrecadação que substituiria os impostos que as empresas recolhem sobre a folha salarial. Por conseguinte, na visão de Paulo Guedes, a desoneração da folha de pagamento estimularia a criação de novos empregos. Quem encampou a ideia foram os empresários do Brasil 2000, grupo que fazem parte Flávio Rocha (Riachuelo), Luciano Hang (Havan), João Appolinário (Polishop), Sebastião Bonfim (Centauro).
A frágil sustentação da proposta revela como o setor produtivo está debilitado frente ao financeiro, ferrenho opositor da proposta. Mais do que isso, a baixa adesão da proposta mesmo entre empresários — para quem a desoneração da folha de pagamento é uma demanda histórica — atesta a importância crescente das atividades de tesouraria das empresas, setor responsável pelas aplicações financeira dos lucros não-reinvestidos.
2- Desconfiança do mercado financeiro.
Oito meses de governo e Paulo Guedes enfrenta dificuldades em cumprir promessas de campanha como o fim dos subsídios, a desindexação do orçamento, as privatizações. Em suma, o ministro se viu apartado das estratégias que, segundo sua visão, reverteriam o estado periclitante da economia e do desemprego.
Sem ousar mexer no Teto de Gastos, a CPMF pareceu a ideia mais rápida para ganhar fôlego fiscal e imediatamente desonerar a folha de pagamentos, dando assim um choque no mercado de trabalho. O mercado, entretanto, não aprovou a ideia e interpretou que o ministro deu provas de fraqueza diante da tarefa hercúlea de redução dos gastos obrigatórios. Deveria ser esse, afinal, o caminho pelo qual o ministro conquistaria espaço fiscal para desonerar os salários sem criar novos impostos.
De todo modo, fica a pergunta: uma vez que a CPMF foi retida, seria uma boa hora para discutir a taxação de dividendos e outros ganhos de capital? Será que o ministro está mesmo disposto a encarar o mercado?
3- Fritura como modo de governo.
À cada medida que desagrada sua base (como o recente anúncio de Eduardo Aras como procurador-geral da República), o presidente recompensa com algum fato político que eletriza os grupos bolsonaristas. Geralmente, o presidente ataca a “esquerda” ou frita alguém do governo que não tenha caído nas graças dos seus apoiadores ou filhos — foi assim com Gustavo Bebianno, Joaquim Levy, general Santos Cruz e, agora, Marcos Cintra.
Por um lado, Cintra irritou os bolsonaristas ao apelar para a criação de novos impostos, ao contrário do que Bolsonaro pregou durante a campanha. Por outro, o secretário da Receita contrariou Flávio Bolsonaro, inspecionado pela Receita Federal, ao não coibir a reação dos funcionários do órgão contra a tentativa de aparelhamento pelo pai. Além de anunciar a CPMF nas vésperas da votação da nomeação de Eduardo Bolsonaro como embaixador nos EUA.
4- Protagonismo do Congresso.
Conforme noticiou o Estadão, logo após o anúncio da proposta da CPFM na terça à noite (10), Rodrigo Maia foi direto ao Planalto para pressionar o governo pela revogação da medida. O empenho do presidente da Câmara deixa claro que os deputados não vão abrir mão de capitanear a reforma tributária. Para se ter uma ideia da pressão, a CPMF não apenas foi travada, como o deputado Rogério Marinho (PSDB), indicado por Maia, agora é o mais cotado para assumir a secretaria da Receita.
Dentro da lógica reformista do Congresso, a reforma tributária integra o conjunto de “reformas estruturais” que os deputados pretendem liderar, tal como fizeram com a reforma da Previdência. O governo, por sua vez, fica responsável por medidas paralelas como a MP da Liberdade Econômica, a autonomia do Banco Central e as alterações no FGTS.